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    ‘Policiais também são afetados pela inversão de valores na segurança’, diz psicóloga

    Uma tragédia ocorrida no último domingo (14/1), no Recanto das Emas, se transformou em mais um caso de alerta sobre as condições de saúde mental dos policiais militares, não só em Brasília, mas em todo o país. Especialista em saúde mental, a psicóloga Marisa Lobo, que costuma palestrar sobre o tema em batalhões, fez algumas observações a esse respeito.

    “A morte do soldado Yago Monteiro Fidelis e de Paulo Pereira de Souza, responsável pelo assassinato do colega e pelo próprio suicídio, reflete um contexto muito grave de adoecimento mental no qual muitos militares se encontram, mas não são devidamente assistidos”, disse ela com exclusividade à Tribuna de Brasília.

    Souza, que passava por problemas psicológicos, estava numa viatura fazendo patrulha com Yago, que estava sentado no banco do motorista, quando foi alvejado na cabeça pelo próprio colega, que se matou sem seguida. No ano passado, o soldado havia comentado sobre os risco de trabalhar com militares em situação de sofrimento mental, mas sem fazer referência ao colega.

    “Na RP tinha que ter só os policiais bons que querem trabalhar. Sem contar o risco de você colocar sua vida na mão de um piorado e na hora do vamos ver você tá sozinho [SIC]”, escreveu ele na época, por meio de um aplicativo de mensagens, segundo Metrópoles. Como se estivesse prevendo o que aconteceria meses depois, ele completou: “Só vai mudar quando der uma merda muito grande”.

    Inversão de valores

    Segundo Marisa Lobo, além da própria profissão de policial já demandar um estresse muito grande e, por isso, exigir atenção permanente quanto à saúde mental dos policiais, o contexto cultural de desvalorização sobre o trabalho dos agentes de segurança também é um fator agravante.

    “O que vemos atualmente é um clima de impunidade permanente, onde os policiais são frequentemente retratados como vilões em grandes veículos de imprensa, enquanto o verdadeiro bandido é romantizado e tratado como ‘vítima da sociedade'”, diz a psicóloga, que recentemente recebeu uma homenagem do Batalhão da PM de Copacabana, no Rio de Janeiro.

    Psicóloga Marisa Lobo recebeu homenagem do Batalhão da PM do RJ. Foto: reprodução/arquivo pessoal

     

    Ela continua: “Esse tipo de cenário pode, sim, agravar uma condição de sofrimento psicológico em um policial que já lida com uma profissão de alto risco, onde a própria natureza do trabalho lhe exige uma capacidade de gestão emocional elevadíssima. Aí, como se não bastasse, temos a impunidade que deprecia esse trabalho e coloca nos ombros do profissional uma série de problemas adicionais, como a sensação de frustração, pressão e cobranças exacerbadas”.

    Questionada sobre o que pode ser feito para mudar ou, no mínimo, atenuar essa realidade, Marisa Lobo explicou que a mudança passa por um conjunto de fatores, os quais devem envolver políticas públicas, acompanhamento individual, informação e conscientização.

    “A saúde mental deve ser levada a sério! Os policiais precisam ter acompanhamento psicológico regular, e não apenas quando o problema aparece. Eles também precisam ser valorizados, e não perseguidos ou atacados injustamente, como temos visto. Os governos, a imprensa e a sociedade como um todo precisam entender isso”, conclui.

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